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quarta-feira, 26 de novembro de 2014

UM OBJETO COMO AMOSTRA DE UMA CONSTRUÇÃO HISTÓRICA

 
UM OBJETO COMO AMOSTRA DE UMA CONSTRUÇÃO HISTÓRICA
 
Rogerio Carlos Petrini de Almeida*
 
 

RESUMO

 
 O presente texto discorre sobre uma imagem de um menino, no suporte fotográfico em papel, escolhido como objeto de estudo e como ferramenta de contextualização, deste objeto, como documento, como fonte histórica. Objeto que traz em si uma potencialidade para contar a história, que emana com provocações e questionamentos como: Quem é? Quando foi? É muito antiga? E afirmações como “não se vê mais fotos deste tipo!”. A imagem naturalmente já emite uma série de informações, porém se aliada a uma narrativa pessoal a constatação de sua época. por certo melhora a visão do contexto registrado no documento.
Palavras-chaves: Fotografia antiga. Fontes Históricas. Narrativa pessoal.
 

1 INTRODUÇÃO

 
         O trabalho em pauta procura identificar o objeto escolhido, quanto a sua forma, dimensão, composição, época em que foi criado e técnica de sua produção. Independente de suas características físicas se estudará o objeto como um possível potencial histórico, contextualizando o documento com sua época e com situações da cidade daquele momento.
 Uma narrativa sobre o documento foi obtida junto a uma fonte pessoal, que descreveu alguns detalhes do episódio, observou as cores das roupas, o motivo da foto, o evento que ocorria, informações que serão gradativamente incluídas quando da descrição do material fotográfico. Para Funari (2008, p.83) há “a idéia de que a História se faz com documentos e que os devemos conhecer muito bem”, razão pela qual se buscou uma fonte que proporcionasse uma narrativa sobre a foto estudada. Funari (2008), também, enfatiza o pensamento de Heródoto, Tucídides e Salustio, quanto a pensarem que a “história se faz com testemunhos, com objetos, com paisagens, não necessariamente com documentos escritos”, o que nos sensibiliza sobre o quanto a imagem fotográfica, posta aqui, pode atuar como documento.
Para Le Coff (1990) documento
[...]É antes de mais nada o resultado de uma montagem, consciente ou inconsciente, da história, da época, da sociedade que o produziu, mas também das épocas sucessivas durante as quais continuou a viver, talvez esquecido, ainda que pelo silêncio. O documento é uma coisa que fica, que dura, e o testemunho, o ensinamento que ele traz deve ser em primeiro lugar analisado desmistificando-lhe o seu significado aparente.[...] (p.548).
 
A foto exposta pode ser considerada fruto de uma pesquisa arqueológica encontrada no fundo de uma gaveta ou, melhor de uma caixa de sapatos, ali esquecida que retoma seus significados. Para Le Coff (1990, p. 012) principia a história de representações com formas diversas entre as quais:
 
 [...] historia das produções de espírito ligadas não ao texto a palavra, ao gesto mas a imagem ou história do imaginário, que permite tratar o documento literário e o artístico como documentos históricos de pleno direito, sob a condição de respeitar sua especificidade[...].
 
 
 
Objetiva-se unicamente avaliar o material quanto a potencialidade de um documento histórico, e seu potencial de memória motivador da narrativa histórica.

 

2  FOTOGRAFIA ANTIGA

O objeto de estudo é uma fotografia tirada em máquina analógica, quando se utilizava filme fotográfico, hoje tal procedimento é raro e ausente das máquinas digitais, que utilizam chip de memória digital. A revelação foi feita em papel fotográfico, da época. Estes dados já prenunciam um relacionamento histórico, e um comparativo de um antes e um depois, levando-nos a um imaginário do uso daquele tempo em relação a modernidade das máquinas digitais, que estão presentes em nosso cotidiano, em equipamentos próprios ou fazendo parte de telefones celulares que portamos em nossos bolsos e sacolas.
A imagem, figura adiante, por si só é reveladora, esta já se apresenta em preto e branco, uma prática da época, utilizada na revelação de fotos, tanto pela raridade de se ter uma máquina fotográfica e filmes que reproduzissem em corres, quanto pelo custo de uma foto produzida em corres. A prática fotográfica tem início em Porto Alegre, no ano de 1853, nos estúdios de Luiz Terragno (ALMEIDA, 2010), a primeira fotografia colorida foi tirada em 1861, em 1907 se produzia filmes coloridos, em 1935 surge o Kodacrhome película colorida que vem a popularizar este filme. Em 1960 os filmes coloridos estão popularizados (FOTOGRAFIAPARATODOS, 2014).
Figura 1: Um menino.
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Fonte: Foto do autor
O papel em que foi impresso, em dimensões de 9 cm por 12,5 cm, material fotográfico em que se deposita a imagem absorvida pela película, era extremamente usual na reprodução de fotos. Deixa-nos a percepção de algo antigo diante da propagação da imagem atualmente, em que tiramos a foto e publicamos em um ambiente tecnológico, virtual, que disponibilizamos a um grupo particular ou deixamos público para ser visualizada.
 Esta fotografia tem um pouco mais de meio século, identificada como do fotografo Leomar, e se mostra sólida como documento comparativo da prática fotográfica do século XX e do início do século XXI, seja pela utilização de máquina analógica, por revelação sobre papel, em preto e branco ou pela limitação de suas dimensões de 9 por 12,5 cm, que hoje se expande a uma exibição em tela digital de muitas polegadas.
A foto apresenta aos nossos olhos a imagem de um menino, em pé, diante de tronco de uma árvore, com um dos braços levantados e olhar fixo em direção a câmara fotográfica, vestindo uma camisa, casaquinho, bermuda, meias até o joelho e sapatos. O fundo da foto é escuro, sem profundidade, identificando uma foto realizada durante a noite.
 No obstante a imagem ser reveladora é, também, objeto portador de memória e suporte documental para trazer lembranças, rememorização e significações de um tempo passado, se entende que as pessoas fazem fotografia para guardarem seus momentos e em um momento diferente reconstruir aquele passado, com isto buscou-se informações sobre o objeto estudado junto a uma fonte oral, que vivenciou aquele momento e narrou brevemente da seguinte maneira:
 
Foi uma festa de família, estavam todos presentes e todos tiram fotos, as priminhas, os priminhos, os adultos. Era noite, e estava vestido de azul claro com camisa e meias brancas, tinha quatro aninhos e a festa foi na casa de seus avós. O fotografo era do bairro mesmo, conhecido, e as fotos eram assim mesmo em preto e branco, e se tirava fotos só em algumas festas (ZILA, 2014).
 
Tal narrativa é fundamental como fonte histórica oral, como construção do imaginário em torno da fotografia, e proporciona por vezes a identificação do fato no tempo, que neste caso se posiciona em 1958, quando o menino tinha quatro anos, para Harres (2008, p. 106), “[...] Avanços na reflexão teórica, em especial em relação à subjetividade, memória e narrativa pessoal, acompanham a prática da história oral, que se desenvolve cada vez mais assumindo seu caráter interdisciplinar. [...]” ao mesmo tempo se reporta a fontes orais como portadoras de “[...] um conjunto de evidências subjetivas sobre os processos históricos [...]”.
A foto de 1958 registra os hábitos de uma época, a maneira de se vestir a própria condição de se fazer uma foto em ocasiões de festa ou eventos familiares, e num sentido mais amplo permite relacionar com o cotidiano daquele tempo. A cidade abrigava 640.000 mil habitantes, com transporte urbano espaçado por ônibus e bondes, sob um regime de ditadura dominante no país. Para constar o local da foto era na zona sul, tida como balneário da cidade, com uma movimentação maior nos finais de semana e durante o período de veraneio, palco de alguns eventos de corrida automobilística durante a década de 1960. Hoje um bairro cercado por outros bairros populosos. Estas poucas referências sobre o contexto da foto tem na perspectiva de Funari (2008) a necessidade de se buscar ferramentas interpretativas para mediar a narrativa, e cita Collinwood (FUNARI, 2008, p. 94) quanto ao relato de que
 
[...] a evidencia não constitui conhecimento histórico disponível e pronto, que pode ser simplesmente engolido e digerido pelo historiador. As fontes tornam-se úteis como fatos históricos apenas quando o historiador as submeter a uma série de conhecimentos contextualizados que ele já possui [...].
 
 O que sugere que a fotografia não deverá ser vista de forma isolada, mas dentro de um conjunto de informações que se tenha conhecimento, para que se possa estabelecer a sua história.
“O papel da fotografia é conservar o traço do passado ou auxiliar as ciências em seu esforço para uma melhor apresentação da realidade do mundo.” (DUBOIS, 2009, p.30),  como argumenta Kossoy (2003, p. 37) é um “ [...] fragmento congelado de uma realidade passada”.
 

3 COMENTÁRIOS FINAIS

 
A foto em estudo evidencia não apenas uma imagem, mas traz consigo mensagens de uma época, e, se constrói como evidência de um passado, como parâmetro entre um passado e um presente. Constitui-se como potencial documento histórico, por mostrar-se como fonte de informação que promove e habilita narrativas de um passado.
A foto quando executada pela ação do click, dispara a construção de uma imagem que é gravada, em um suporte, já se evidencia como um fato passado que vem carregado de memórias de informações, que produzem narrativas sobre o registrado naquele momento.
 
ABSTRACT
 
This paper discusses an image of a boy, the photographic paper backing, chosen as an object of study and as a contextualization of this object as document tool, as a historical source. Object that carries a potential to tell the story, emanating with taunts and questions such as: Who is? When was it? It is very old? And statements like "do not you see more pictures of this kind." The image has naturally emits a lot of information, but if combined with a personal narrative of his time to finding certainly enhances the vision recorded in the document context.

Keywords: Antique photograph. Historical Sources. Personal narrative.
 

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Rogerio Carlos Petrini. LUIGI TERRAGNO: TREZE FOTOGRAFIAS. 2010. Disponível em: <http://rogeriopetrinialmeida.blogspot.com.br/2010/12/luigi-terragno-treze-fotografias_4410.html> Acesso em 24 nov. 2014.
 
DUBOIS, Philippe. O ato fotográfico e outros ensaios. Campinas, Papirus, 1994
 
FOTOGRAFIAPARATODOS. Fotografia Colorida. Disponível em: http://www.fotografiaparatodos.com.br/fotografia/?p=39 Acesso em: 24 nov. 2014.
 
FUNARI, Pedro Paulo, Os historiadores e a cultura material. In: Fontes históricas.
 Pinsky, Carla, Bassanezi, (org.), São Paulo: Contexto, 2008, p. 81-109.
 
HARRES, Marluza Marques. Historia oral: Algumas questões básicas. Anos 90: revista do programa de pós-graduação de história da UFRGS.Porto Alegre, v.15, n. 28 , p.99-112. 2008.
 
KOSSOY, Boris. Fotografia e História. São Paulo: Ateliê Editorial, 2003.
 
LE GOFF, Jacques, História e memória. tradução Bernardo Leitão ... [et al.] -- Campinas, SP Editora da UNICAMP, 1990.
 
ZILA, Maria de Almeida. Imagem fotográfica. [out. 2014]. Entrevistador.
Rogerio Carlos Petrini de Almeida. Porto Alegre, 2014. Anotação transcrita no texto.


* Aluno do Curso de Museologia – FABICO / UFRGS. Trabalho realizado como pré-requisito para avaliação da disciplina BIB03057 – Introdução aos Estudos Históricos Aplicados à Ciência da Informação, ministrada pela Professora Marlise Giovanaz. Porto Alegre, nov. de 2014. E-mail: rogério_petrini@hotmail.com.
 

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