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sábado, 11 de abril de 2015

A exposição museológica e o conhecimento histórico resenha

RESENHA
A exposição museológica e o conhecimento histórico
 
Rogerio Carlos Petrini de Almeida[1]
 
Ulpiano Toledo Bezerra de Meneses: Professor Emérito da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, titular aposentado de História Antiga, docente do programa de Pós-Graduação em História Social, Licenciado em Letras Clássicas (USP, 1959), Doutorado em Arqueologia Clássica (Sorbonne, 1964). Dirigiu o Museu Paulista/USP (1989-1994), organizou o Museu de Arqueologia e Etnologia/USP (1963-8) e o dirigiu (1968-78). Membro do Conselho Superior da FAPESP (1977-79), da Missão arqueológica francesa na Grécia (antigo membro estrangeiro), do CONDEPHAAT (1971-87, 1996-2004, 2006-7), do Conselho do IPHAN (desde 2005).
Palavras-chave: Exposição. Objeto. Museu.  Museu Histórico
 
O autor comenta sobre o teatro da memória ao laboratório da história, começa com a etimologia da palavra teatro e chega ao termo “ver” como conotação para teatro, e para se chegar as coleções de objetos materiais de diversas espécies organizadas por proprietários funcionando como paradigmas visuais que recriamos simbolicamente a ordem do mundo e o espaço do exercício de seu poder. Diz que o teatro da memória propunha articulação de imagens e lugares e espaços para a rememoração, surgindo neste contexto o museu como teatro da memória e dando lugar ao museu histórico a partir do teatro de memória que se evidenciam a partir da seleção mental, do ordenamento, registro e interpretação, síntese cognitiva na apresentação visual, com impacto pedagógico da representação do museu histórico. Comenta que o museu histórico contemporâneo tem uma série de problemas, mas volta o debate para a participação deste tipo de museu na produção histórica, na direção em que ele possa trazer uma contribuição específica, na produção de conhecimento e como nessa perspectiva funciona a exposição museológica. Limita a problemática da exposição museológica, a formação de coleções e curadoria.
O autor estabelece premissas iniciando com o discurso sobre “museu e o acervo” e colocando como notável renovação no campo geral de Museologia, os conceitos de ecomuseus, que inseriam a temática das responsabilidades sociais, e abriram discurso para museus como “templos”, que guardam valores e os museus como “fóruns”, como “espaços de criação, do debate e da interação”, mas verifica que o suporte patrimonial e o problema em ambos, templo ou fórum, podem ser altamente conservadores.
O autor questiona se é possível museu sem acervo e reformula a pergunta para: “há, ainda, relevância e utilidade, entre nós, no papel que possam desempenhar museu com acervo?”, justificando o sim, pela alta quantidade de coisas materiais indispensáveis a nossa sobrevivência: fisiológica, psíquica, e social. “Os bens materiais não são só um produto, mas valores de relação sociais e os museus só se interessam pelos objetos materiais por causa do sentido” (pensamento de Taborky, citado pelo autor), que são capazes de assumir valores cognitivos, estéticos, afetivos, sígnicos. A documentação do museu garante a democratização da experiência e do conhecimento, neste assunto o autor resalva a importância da documentação, das responsabilidades documentais no campo da cultura material.
A próxima premissa aponta para a “tipologia de museus: o museu histórico” reflexiona se os museus de história podem operar tanto na dimensão do espaço como na de tempo. Coloca o pensamento dos autores Harbiont (organização do tempo) e Ricoew e Graig (máquinas que inscreveram tempo e espaço) que estas condições  “encapsulam o tempo usando categorias analíticas para segmentá-lo exibindo periodizações e estabelecendo hierarquia pela alocação diferencial e mobilização de espaços.” Os museus complexos são modelados como museus de história natural integrado a atuação da sociedade, ideologia americana. No Brasil nos anos de 1800 o modelo é de história natural integrado a antropologia. Os museus a partir deste século apresentam uma tipologia multiforme (museus: enciclopédico, de arte arqueologia, folclore, ciências...) e nos anos de 1920 aparecem categorizado como museu de história. O autor comenta a diferenciação do objeto entre tipologias, referenciando que no museu de arte o objeto tela é valorizado como documento plástico, enquanto no museu histórico o mesmo tem valor iconográfico. Com esta comparação, vê a necessidade de ser considerada a relação dialética entre objeto e problema e problemas, exemplificando que um material exposto poderia não ficar claro em uma exposição e não representar significações de tempo e espaço; que seria adequado incorporar a exposição equipamentos e iluminação, capazes de permitir o entendimento deste domínio sobre o tempo, ou estabelecer o domínio da duração das coisas, da vida útil dos objetos.
Sobre o objeto histórico e documento histórico o autor comenta, em primeiro lugar que da categoria básica do objeto, a categoria sociológica do objeto histórico é atribuída como um sentido prévio e imutável que o impregna (de fatos memoráveis da historia). São objetos singulares e auráticos, não fungíveis, insubstituíveis por cópia, sem valor de uso, semióforos. Como relíquias, semióforos, objetos históricos tem a essencialidade de seus compromissos com o presente, é no presente que são reproduzidos como categorias de objetos e as necessidades do presente que eles respondem. O autor comenta ainda que o objeto histórico é um vetor da classificação social que como objeto histórico privilegia as elites dominantes, são móveis de classe, objetos de luxo, símbolos do poder, telas. O objeto histórico é de ordem ideológica e não cognitivo. O objeto purificado da retórica, objeto concreto, pode existir somente saturado de hiper-realidade. O museu histórico opera com objetos de história e deve operar com problemas históricos que dizem respeito à dinâmica na vida social. O autor parte para a questão documento histórico, documento como suporte de informação e diz que qualquer objeto pode funcionar como documento. O documento sempre se define em relação a um terceiro, externo a seu contexto original. A questão documental cria o sistema documental.
A exposição histórica, título que o autor inicia colocando a exposição como convenção visual, organização de objetos para a produção de sentidos. Reflete que uma primeira orientação de uma exposição deveria ter como “meta a alfabetização museológica, uma função educacional do museu que ensinam o que é museu, o que é uma exposição a partir de um núcleo básico e simples em que predomina a linguagem dos objetos.” Sob o dilema “objeto ou ideia”, o autor questionou o que é a exposição: uma exibição que oferece ao olhar o objeto, ou a ideias? E diz que a exposição somente pode exibir objetos circunscritos em sua própria concretude como ritual de idolatria. O objeto aparece como suporte de significações que a própria exposição propõe e cita Shanks & Tilley que fala que a “exposição museológica pressupõe forçosamente uma concepção de sociedade, de dinâmica de cultura, de tempo, de espaço, de agentes sociais.” Sobre o objeto na exposição são questões nas quais a reflexão de natureza como convenção e distinção entre objeto histórico e a relevância do problema apontam a direções a serem tomadas. Aborda o assunto do objeto fetiche, que na exposição histórica é a fetichização do objeto na exposição que é inserida na dimensão de fenômeno histórico ou social. O objeto metonímico, por sua vez caracteriza a exposição antropológica, o objeto perde seu valor documental passa para um ícone cultural, de valor, emblemático. O Objeto metafórico reduz a “exposição a uma exibição de objetos que apenas ilustram sentidos, conceitos, ideias, problemas que não foram deles extraídos, mas de fontes externas.” A instalação artística na exposição surge na arte contemporânea dependente de suporte físico desmaterializa a obra, incorpora o espaço circundante provoca intervenções no ambiente, e esvazia a especificidade do documento histórico. Sobre a contextualização museológica, Ulpiano, comenta que “não se tem visto qualquer esforço na conceituação do que seja contexto e de como e porque ele permite ampliar as significações do objeto (...)” sendo que o museu é uma forma institucionalizada de transformar um objeto em documento e que se deve tomar alguns cuidados com a reprodução do contexto que são pura aparência  e inverte o papel da exposição na produção de conhecimento.  O “living museum” refere-se a exposição desenvolvida a partir do modelo de museus ao ar livre que reifica o passado, vangloriam de introdução de temas democráticos, caracteriza o vazio a que pode conduzir uma intenção superficial de comunicação. A exposição e discurso, um texto, e sobre este aspecto pressupõe a articulação de enunciados sobre certos problemas humanos, desenvolvidos como o suporte das coisas materiais.
A história e museus históricos: o laboratório da história, tópico em que o autor faz o questionamento “pode-se expor História em Museu?” e responde um – não -  justificando que a história não poder ser visualizada e um – sim - pela história ser forma de conhecimento e tem lugar assegurado no museu histórico, que coleta, estuda e comunica documentos históricos. Quanto a exposição histórica diz que é aquela que a comunicação dos documentos  permitem inferir sobre o passado e dinâmica da sociedade, não sendo compatível com a síntese pois exposições desse tipo serão panoramas alegóricos além dos inconvenientes da síntese, e nem podem ser explicativas fora de quadros de representação como a estrutura em funcionamento; não podem representar processos, dinâmica social, mas podem representar vetores desses fenômenos. As possibilidades da exposição histórica são privilegiadas, “aos museus não competem produzir e cultivar memórias, mas analisá-las, pois elas são um componente fundamental da vida social”.
O autor analisa os problemas e debates colocados por dez especialistas de diversas origens e área se posicionando sobre este tema, e chama atenção para três linhas de pensamentos: a primeira que o museu de história é problemático, não se referindo a exposição, em segundo lugar identifica-se a minimização da perspectiva da cultura material e, por fim, ao demarcação entre a academia e o museu, pelas divergências que tem quanto ao campo de produção de conhecimento. Tece o comentário, dos analistas, em seis tópicos: o primeiro “Museus históricos, identidade, ideologia, nação”; sobre museus históricos, coloca aos pesquisados, a condição da taxonomia e do campo semântico, e considerou redutora uma conceituação definitiva. Na questão da exposição histórica, diz que “não acredito que a exposição capaz de explorar a produção do conhecimento histórico com objetos, deva excluir exposições informativas, classificatórias, puramente estéticas ou didáticas”. Quanto a identidade diz que “negar, em nosso tempo, a presença da identidade nacional no território dos museus seria fechar os olhos à realidade”. A ideologia por sua vez caracterizam os museus históricos, pois constituem os ingredientes da vida social. O segundo tópico abordado é o “Acervo: cartório, operacional, virtual”, dando ênfase ao museu com acervo, organizado, institucionalizado, não desconsiderando a existência de museus sem acervos e acervos sem museus e registrando que o acervo de um museu histórico jamais poderia ser limitada as coleções depositadas e cadastradas intra-muros, advindo daqui a noção de acervo cartorial e acervo operacional. Para acervo operacional pode ser definido como o tratamento museológico de paisagens, estruturas, monumentos e equipamentos, contextualizados que são musealizados por decisão institucional e cuja ação é feita pelo levantamento e sistematização de informação. A questão de manifestação virtual é vista pelo autor com algumas restrições, mas se coloca frente aos desafios  desse novo horizonte que implica em riscos e exigências de adaptação. O teatro versus laboratório, questionamento feito pelo autor que observa na contextualização do teatro o problema da orientação paternalista e a espectacularização do real, mas não desvaloriza a percepção e o jogo dos sentidos, com relação ao termo laborário esclarece a relação como sendo  um lugar onde há trabalho por fazer, não se tratando apenas de atividades a fazer mas da importância da análise e das experimentações. No questinamento sobre o “público”,  recebe respostas de sua ausência neste contexto o que discorda refletindo que uma  fração da sociedade  interage com o museu se beneficiando deste e que não há como excluír ou discriminar o público deste contexto e que é participativo da exposição. Questiona o museu/academia quanto a história pública e afirma inicialmente que o museu histórico é um lugar de pesquisa histórica e que a figura do historiador de museu vem surgindo em toda parte. Reflexiona, neste item, as diferencas ou semelhanças entre os profissionais que atuam dentro ou fora da academia. Por fim questiona a seus entrevistado sobre “a crise nos museus” e comenta que os componentes da crise são: “o mercado simbólico, a indústria cultural, a comunicação de massa, a sociedade de consumo, da informação, de lazer, a realidade virtual e a marginalização social e a globalização, mas reforça que “sempre haverá espaço para o museu crítico, enquanto houver espaço para ação consciente no mundo.”
De fato as questões ao redor da existência do Museu Histórico e do seu acervo, são bastante problematizadas, na atualidade, especialmente pelas situações levantadas pelo autor se referindo aos componentes da crise nos museus, mas não são só estes elementos que se visualiza, a falta de recursos financeiros e interesse do Estado, e educação precária, desfavorecem o interesse pelo museu histórico, sem computar a ação de gestão arrastada, em seu interior, que se acomoda pela situação. O fruto benéfico do museu seria a exposição, e como o autor enumera, começando por expor a si próprio, mostrando-se e ensinando a apreciação do acervo, o que nos deixa na mesma visão de Ulpiano de que “sempre haverá espaço para o museu crítico”. 
 
REFERÊNCIA
MENESES, Ulpiano T. Bezerra de. A exposição museológica e o conhecimento histórico. In: FIGUEIREDO, Betânia Gonçalves; VIDAL, Diana Gonçalves (orgs.). Museus: dos gabinetes de curiosidade à museologia moderna. Belo Horizonte, MG: Argvmentvm; Brasília, DF: CNPq, 2005, p. 15- 84.


[1] Aluno do Curso de Museologia – FABICO / UFRGS. Trabalho realizado como pré-requisito para avaliação parcial da disciplina Expografia (BIB03212), ministrada pela Professora Vanessa Barroso Teixeira. Porto Alegre, abr. de 2015. E-mail: rogériopetrini@gmail.com. Este trabalho consta no Blog do autor.

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